Alguma coisa acontece com as dominantes secundárias

Salve, se você não sabe esse post faz parte de uma série de aulas do meu curso Harmonia da canção brasileira HCB, um curso completo de harmonia gratuito. A playlist do curso tá aqui:
https://www.youtube.com/playlist?list=PLNBVmP6AbU_Wm36r5y_hnAuwVFn1gWGcQ


Bom, na última aula, você ficou de ver aqui na música Sampa do Caetano Veloso o que era dominantes primárias, dominantes secundárias e dominantes individuais.

O que estamos fazendo agora é uma análise beleza? Quando o acorde ou grau for menor, vamos anotar com um número romano minúsculo relativo ao grau, e quando for maior, com um número romano maiúsculo, certo?
O vermelho aqui na lousa representa a tônica, e as outras cores uma região do tom da música, conforme vimos aula passada.

Então vamo nessa, primeiro toque a música toda:

https://youtu.be/haiyLrN-0WI

Certo, a canção está no tom de dó maior, e começa na tônica, depois vem o Bm711, o E7b9, e o Am pelos próximos compassos, alternando as sétimas, ou seja, descendo cromaticamente.
Perceba que o Bm711 e o Bm7b5 tem uma diferença minúscula, podemos pensar nele como ii do Am. Ou seja temos aqui um arco de iim7b5-V7-i.

Logo depois, você vai ver que Gm7, Gb7#11 cumprem o papel do ii-V7 do Fá maior. Vamos falar mais pra frente dessa equivalência entre iib7#11 e do V7, o acorde dominante, mas você pode ver mais disso no meu ebook: Quase tudo o que você precisa saber sobre harmonia:


De qualquer forma, o que há aqui é mais um arco de ii-V. Ou seja, até o quinto compasso, já tivemos dominantes secundárias para a região de Lá menor e Fá maior.

Agora o que aparece é mais uma dominante secundária, dessa vez do próprio ii do tom de Dó, o que é muito comum na música brasileira A7 – Dm7 – G7. Temos aqui um acorde que prepara para o ii-V-I do tom, mas que nunca chega em Dó.

O G#dim aparece aqui totalmente alheio ao C.H.(Campo harmônico) do tom, mas poderia vir de um outro C.H., o C.H. de Lá Menor harmônico . Acalma o coração que ainda vamos falar desses C.H. nos próximos módulos.
Por enquanto, vamos só observar como as notas desse acorde se aproximam do que vem a frente, ou seja, o acorde de Lá menor e como elas podem resolver por um tom ou meio tom nas notas do próximo acorde.

Nos próximos seis compassos, o que acontece é um grande arco de ii-V7 do Sol, mas que novamente nunca resolve. Percebe como o Caetano “estica” sua expectativa, coisa de quem realmente manja da poética da harmonia.
É como se você andasse pelas ruas de São Paulo mas ficasse perdido na Ipiranga com a São João e não chegasse em casa ou no seu destino nunca.

Ao invés de resolver em Sol ou trazer Sol como dominante para resolver em Dó, o D7 vira Dm79, seguido de um G7 com a 13ª caindo de meio em meio tom.

Novamente, a resolução poderia vir a seguir em Dó, mas ao contrário, Caetano vai para um Gm7 e C79, jogando a sensação para a região da sub-dominante, no que a gente poderia chamar de afastamento, já que abre para o quarto grau, outra região de Dó.

Lembra da base I-IV-V? Se não lembra, volta lá e assiste as aulas do primeiro nível da harmonia tonal:

A seguir, rola uma aproximação parecida com aquela feita para o Lá menor há pouco, por notas mais graves através de uma vii Dim que vem no papel do F#dim, pra chegar no C/G;

Logo a seguir, o ritmo harmônico aumenta, ou seja, tem dois acordes por compasso, e aí aparece novamente a dominante secundária do ii (A7-Dm), seguida da dominante primária G7, que de novo, não resolve.

A partir daí, pra fechar, Caetano escreve uma sequência de dominantes. Ou seja, surge uma dominante da dominante, da dominante, da dominante – E7 – A7 – D79 – Abm6 G7.


É uma forma de usar o próprio eixo arquetípico de quartas do tonalismo pra navegar por regiões, até chegar onde quer. E com essa palavra chique “eixo arquetípico de quartas” quero dizer o que já falei aqui: são várias cetas que vão te apontando em uma direção numa trilha.
Quanto ao Abm6, novamente, vamos por enquanto pensar nele aqui como uma aproximação cromática descendente para o G7, e no futuro voltamos a falar desse tipo de acorde.

Caetano novamente estica nossa expectativa até finalmente chegar ao G7 – C69 e voltar ao G713 – G7b13 e recomeçar a música lá no primeiro Cmaj7 do primeiro compasso.

Se reparar bem, apesar de todos os ii-V, Caetano só faz passear pelas regiões aqui, usando dominantes secundárias e acordes de aproximação. Mas flagra bem: Começa em , vai pra Am, depois , volta pra , segue em Sol, de novo, novamente, de novo, e aí entra a sequência de dominantes pra chegar em casa (Dó finalmente). Ou seja, são todas regiões de Dó maior, porém com “floreios”.

Pra mim essa música combina a poética da harmonia perfeitamente com a poética literária, porque com um texto corrido sem refrão e a harmonia dinâmica, parece mesmo que você tá andando por uma cidade grande quase sem rumo. O interessante é que Caetano nunca se assume enquanto músico, ele acredita que não se encaixa nessa categoria. Agora eu te provoco: um não músico conseguiria fazer uma canção dessas intuitivamente, sem nunca ter estudado harmonia formalmente?

E aí, você acertou onde tinha dom primárias e secundárias? Solta aí nos comentários, aproveita e já deixa aquele like generoso no post ou no vídeo e compartilha com quem quer realmente aprender música, se inscreva no canal lá do youtube pra ajudar o tio aqui.

É isso, parabéns por subir mais um degrauzinho nos seus estudos e vamo que vamo para as próximas aulas!
Forte abraço!

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